Série Nuptias, 2017
série Nuptias, 2017
150 fotopinturas
31 x 25 cm; 25 x 31 cm; 31 x 50 cm
técnica mista sobre fotografia
Nuptias
Me
parece que a sociedade sofre cada vez mais com uma ansiedade
generalizada, provocada pelos "excessos". Excesso de tudo: de
comunicação, de acessibilidade, de consumo, de contraste entre pobreza e
riqueza, entre desejo e realização; esse excesso empurra a satisfação
e, consequentemente, a felicidade, para muito longe, sempre muito além
do nosso alcance. As cerimônias dos tradicionais matrimônios parecem ser
tanto o termômetro desse sentimento quanto a própria febre.
Entretanto
e entre tantas frustrações, casamentos se tornam imperfeitos por muito
pouco. Me interesso pelo documento daquilo que foi sacramentado e depois
desfeito, quer seja pelo tempo ou pelo próprio ser humano. Casamentos
hoje não parecem valer muita coisa, apesar do ainda alto valor simbólico
da cerimônia e do altíssimo preço que se paga para realizá-las. É
impressionante a quantidade de fotos de casamento que são encontradas
nos mercados de pulgas, só não superada pela quantidade de fotos que são
realizadas hoje, digitalmente, nas inumeráveis cerimônias, cujo ideal
de pompa e circunstância varia em conformidade com o poder de compra das
diferentes classes sociais.
Por
outro lado, percebe-se que nesse século as sociedades de maneira geral
têm sinalizado, de várias maneiras, mudanças radicais no modelo
tradicional da união amorosa. Como exemplo, temos visto com maior
frequência a oficialização de uniões entre casais homossexuais e os
esforços de vários segmentos da sociedade em compreender e aceitar as
novas variantes nos modelos de gênero. Digo vários segmentos, mas não
todos. A aceitação dos novos modelos não é unânime e, menos ainda,
universal. No Brasil, por exemplo, o que parece ser natural para muitas
pessoas ainda é considerado uma doença ou um desvio comportamental
abominável, e em alguns países da África ou da Ásia, até mesmo crime.
Estamos ainda muito longe da harmonia e da sabedoria e, infelizmente,
talvez a humanidade pereça antes de atingi-las.
Finalizando,
mesmo se consideramos as uniões entre casais convencionais, isto é,
homens e mulheres em matrimônio, os papéis sociais exercidos por eles
vêm se modificando ao longo dos séculos e principalmente a partir do
final do século 19, suas consequências geraram sintomas que, inclusive,
serviram de combustível para para novas áreas do conhecimento como a
psicanálise. Entretanto, o que muitos consideram como um avanço na
história da humanidade e da cidadania, como por exemplo a importância do
papel da mulher nessa construção, parece ser obscurecido e até ignorado
por vários. Mesmo em sociedades consideradas liberais e em segmentos
supostamente bem informados, temos assistido a demonstrações lamentáveis
de cegueira social, como por exemplo, as opiniões expressas pelo atual
presidente do nosso país sobre papel da mulher na economia brasileira:
liderança na comparação de preços nos supermercados. A despeito da
virulência das doenças contemporâneas, uma coisa é certa: só o amor nos
salvará!
Nuptias Series, 2017
Nuptias series, 2017
150 photo-paintings
31 x 25 cm; 25 x 31 cm; 31 x 50 cm
mixed media on photography
Nuptias
It seems to me that society suffers more and more with a generalized
anxiety, caused by "excesses." Excess of everything: communication,
accessibility, consumption, contrast between poverty and wealth and between
desire and fulfillment. This excess pushes satisfaction and, consequently,
happiness, always far beyond our reach. Ceremonies of traditional matrimonies
seem to be both the thermometer of this feeling and the fever itself. However,
among so many frustrations, marriages become imperfect for very little. I am
interested in the documentation of what has been blessed and then undone, no
matter if it happened by the time or by the very human being. Marriage today
does not seem to worth much, despite the still high symbolic value of the
ceremony and the very high price that is paid to carry it out. It is amazing
how many wedding photos can be found in flea markets, not only surpassed by the
number of photos that are digitally held today in the countless ceremonies
whose ideal of pomp and circumstance varies according to the standard of living
of different social classes .
On the other hand, we see that in this century, in general terms,
societies have pointed, in many ways, radical changes in the traditional model
of loving union. As an example, we have seen more often the officialization of
weddings of homosexual couples and the efforts of various segments of society
to understand and accept the new variants in gender models. I say several
segments, but not all. The acceptance of the new models is not unanimous, much
less universal. In Brazil, for example, what seems natural to many people is
still considered an abominable disease or behavioral deviation, and in some
countries in Africa or Asia, even a crime. We are still a long way from harmony
and wisdom, and unfortunately humanity may perish before reaching them.
Finally, even if we consider the weddings of conventional couples, that
is, men and women in matrimony, the social roles they have played have been
changing over the centuries and especially after the middle of the 19th
century; some of their consequences and symptoms became the fuel for new areas
of knowledge such as psychoanalysis. However, what many consider as a breakthrough
in the history of mankind and citizenship, such as the importance of the role
of women in this construction, seems to be obscured and even ignored by several
people. Even in societies that are considered liberal and in supposedly
well-informed segments, we have seen pitiful demonstrations of social
blindness, such as the opinions expressed by the actual president of our
country on the role of women in Brazilian economy today: leadership in the
comparison of prices in supermarkets. In spite of the virulence of contemporary
diseases, one thing is certain: only love will save us!
Rosângela Rennó